quinta-feira, 21 de novembro de 2019

O Pé de Maracujá

Pense numa floresta encantadora, um lugar mágico que ocupa um espaço menor que um quarto, situado no canto de um muro, numa casa de esquina no interior de Minas Gerais. Assim era meu pé de maracujá. Ele havia crescido no encontro dos dois muros, no bico da rua. Seus galhos grossos se entrelaçaram de tal modo que era possível caminhar em cima. Debaixo dele era escuro, mas o sol da tarde conseguia entrar por algumas frestas e salpicava o chão com pequenos círculos de luz. Lembro-me de suas folhas verde-escuras em forma de estrelas encolhidas e de como eram lisas, e de como as folhas de cima refletiam a luz da tarde.
Aos pés do maracujazeiro cresciam folhas de hortelã e um perfume fresco se espalhava por todo canto. E quando as flores do maracujá se abriam não se sabia dizer qual o perfume mais gostoso. Eu achava as flores de outro mundo. As pétalas como estrelas de várias pontas e rodeadas de penugens que do miolo as bordas iam de roxo ao branco atraiam os mangangás com aqueles corpos gordos e asas barulhentas. Eu morria de medo, mais adorava vê-los em sua visita alegre e ruidosa. As borboletas eram um caso aparte. Tinham asas de cor laranja. Algumas com nervuras pretas e pintinhas brancas outras com asas de um tom mais claro de um lado e levemente prateado do outro. Mas o que tinham em comum era que quando estavam pousadas, abriam e fechavam as asas devagar. Sempre me perguntava por que não podiam simplesmente ficar imóveis desfrutando com calma daquele néctar que parecia estar uma delícia? Vai lá saber, né... a natureza e seus costumes. Mas descobri um dia que eram de lá, do interior da floresta que vinham. Seus casulos ficavam bem escondidos nos galhos, entre as folhas. Eram simples, marrons, mais, hoje pensando com mais clareza, eram lindíssimos...!
O interior do maracujazeiro era uma floresta repleta de criaturas selvagens, uma caverna inexplorada ou, uma cabana de férias nas montanhas, dependendo do dia e da vontade. O teto era uma excelente cama, onde se podia deitar e contemplar o céu azul, ou ficar sentado de bobeira, conversando sobre qualquer coisa. Mas hoje penso que se eu pudesse voltar no tempo, aproveitaria bem mais a visão do céu daquele lugarzinho. A gente com essa mania de querer voltar no tempo...

Um comentário:

  1. Que belo texto, meu amigo, poético e de riquíssima linguagem. Como são as coisas, né...? Quando crianças, um simples pé de maracujá pode ser o nosso jardim secreto. Por que será que, em adultos, precisamos (ou pensamos precisar) de tantas superficialidades para viver? Enfim... Não pare de escrever, meu amigo.

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